segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Meu eterno Bru

A morte é a única certeza da vida, e eu sabia que um dia ou outro teria que me encontrar com ela. Nunca fiz questão e nem me preparei para isso.

Lembro direitinho, do alto dos meus 10 anos, o dia em que fui com o meu pai até a casa de um amigo dele. Descemos do carro, o amigo abriu o portão e lá veio um filhote de rotweiller, gordinho e com cara de esnobe. Ele tropeçou no portão, e nem isso fez com que ele parecesse menos nojentinho.

Eu peguei ele no colo, falei: Oi Bruce. E carreguei faceira pra dentro do carro. Era a realização da minha maior vontade. Larguei no banco traseiro e logo ele se disperçou de mim. Foi num cantinho, onde tinha um feixe de luz e deitou. Achei que ele não tinha gostado de mim e fiquei até sentida.

Durante o caminho até em casa, lembrei do dia que meu irmão sugeriu o nome. E os dias seguintes em que preparamos uma caixinha de papelão com uma almofada dentro e dois potes para comida e água. Estava tudo esperando por ele na área de serviço de casa.

Quando chegamos observei o olho brilhando de todo mundo. Até da minha mãe que não queria cachorro em casa em função da sujeira, gasto e até de uma lembrança triste de uma cadelinha que teve quando pequena.

Todo mundo ficou em volta dele, como se disputássemos atenção. As primeiras noites foram de muito choramingo durante a noite. Eu não resistia ao chorinho e sempre dava um oi pra ele, tentava dizer coisas que pudessem lhe fazer ficar mais calmo pra brincarmos no outro dia.

O nosso pátio grande e cheio de grama deixa qualquer cachorro à vontade. E com o Bruce não foi diferente, ele corria muito! Tanto que o cansaço sempre vinha antes para a gente. Os passeios pelo bairro eram cansativos e engraçados. O Bruce queria mesmo é fazer amizade, e chorava quando os cães vizinhos não queriam nem saber de conversa.

Durante grande parte da sua fase agitadíssima, ele arrancava todas as plantinhas do canteiro, adorava comer prendedores, gostava muito de pular em todo mundo com as patinhas cheias de barro e arranacava muitas risadas quando 'andava' de skate.

Além de tanta atividade, ele também era inteligente! Abria a porta do seu cantinho, a garagem, com um pulo e uma pata. Algumas vezes acendia a luz e por várias arrastava o pote de comida vazio até a porta. Desenvolveu também uma técnica de passar as unhas na porta e fazer um barulhão pra nos chamar, e era notável, o som era alto e rendeu uma porta toda arranhada.

Houveram episódios de maior destaque, como às vezes que ele fugiu de casa. Por descuidos, umas três vezes deixamos o portão entre aberto, um prato cheio pro Bru. Na sua maior aparição pela rua, ficou de cara com um ciclista - figura que ele odiava - e não fez nada. Na verdade só foi até a esquina fazer um xixizinho e apavorou toda a rua. Meu tio ligou dizendo: "Bá, acho que o Bruce tá na rua!". Saímos insandesidos pra buscá-lo.

Aquela cara de quem fez arte e estava arrependido convencia qualquer um. Castigo? Só uma chinelada e um dia sem pãozinho, quem sabe. Mas ele ficava tranquilo, sabia que no outro dia todo mundo ia esquecer e dar Biscrock pra ele.

Na primeira vez que esteve com um machucadinho, revirou três veterinários e sujou toda a clínica com as patas. Isso fazia juz a sua coleira de 60cm apertada. Mas era tão amável que acabou cedendo e pela primeira vez chorei vendo ele tristinho e molenda da anestesia.

Foi só um episódio rápido. No dia posterior ele já estava correndo e brincando com uma das inúmeras bolinhas que teve. Ou quem sabe cavando um buraco, ou mais: descobrindo um vazamento nos canos de casa. Podia até trabalhar como auxiliar na Corsan.

Apesar de algumas artes, o meu nenê era muito amável. Podia sentir quando estávamos tristes, e era compreensível o suficiente pra fazer companhia e carinho. Nunca me esqueço quando saí no pátio e ele estava dormindo na rampa da garagem junto com o meu pai no solzinho, foi uma cena linda.

Neste quesito meu pai sempre foi o mais presente, toda noite ficava bastante tempo com o Bru. Grandes amigos, parceiros de todas as horas. Meu irmão nem tanto, mas tinha uma boa relação, de respeito, o Bruce obedecia aos comandos dele. A mãe não conseguia não dar um pãozinho com patê pra ele e o chamava com apelidos carinhosos nas suas caminhadas pelo pátio.

Depois de tanta agitação, o Bru começou a dar os primeiro sinais de que já não era mais um jovenzinho, nem queria mais tanta brincadeira, preferia ficar quietinho, mas sempre na nossa companhia.

A saúde já não era a mesma, ficou acima do peso e a coluna já começava a falhar. E sentíamos que o Bruce não era mais o mesmo, sentíamos que o ritmo era outro. Meu coração apertava cada vez que eu via as patinhas dele fracas e que ele ficava brabo com isso.

Foram sete dias de dor e tristeza, não era só a coluna, mas também os rins que incomodavam. E foi então, que no dia 12 de setembro, um domingo à noite que chegamos faceiros em casa, com a crença na motivação que o veterinário havia nos dado, que o Bru estava deitado no pátio, somente em corpo. O meu nenê tinha ido embora.

Nesses dias ele só ficava dentro da casinha, mas na hora de ir embora, tentou ficar perto da gente, mas não conseguiu.

No momento que percebi a presença da morte, senti um aperto no peito muito forte. Minhas pernas quase não aguentaram e chorei em soluços a perda de um membro da família.

Doeu muito e está doendo ainda. Um amor puro e verdadeiro, sem nenhuma maldade, não tinha como não doer. O Bruce nos proporcionou tantos sorrisos! Foram nove anos. E agora são oito dias sem ele. Oito dias de imensa saudade.

É estranho chegar em casa e não vê-lo. É horrível perceber que a morte o tenha levado, deixando esse pátio vazio e sem graça. Não entro na garagem sem deixar um lágrima ao ver que algum objeto dele ainda está ali.

Pode parecer exagero pra alguém que já perdeu uma pessoa querida, mas o Bruce era nosso. Pra gente, só ele tinha aquele corte na língua, só ele uivava pra ambulância, só ele invandia a área em troca de um pãozinho, só ele era capaz de nos arrancar um sorriso quando estávamos todos brigados.

A morte é mesmo cruel e não dá nem tempo da gente sofrer. A vida segue e cada um com seus problemas.

Não sei como terminar esse texto, não sei nem como comecei. Só sei o amorzinho da minha vida se foi e eu nunca mais vou ver a piscadinha dele pra mim.

Te amo.









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